Antes de pisar na Espanha em 2018, trocando emails com professoras da Universidade, eu experimentei o primeiro choque cultural: elas se expressavam de uma maneira direta e sincera. Desacostumada, eu tomava isso como uma grosseria e me ofendia. Esta semana, minha companheira de apartamento espanhola comentou que achava que os seus amigos latino-americanos “davam muitas voltas” para expressar o que queriam dizer. Ela admirava a cordialidade mas muitas vezes se sentia confusa. Comento essas duas situações para destacar o que eu tenho aprendido com essas diferenças culturais: a ser mais clara quando eu me expresso, a me permitir ser mais sincera e direta, e a esperar o mesmo das outras pessoas. Isso tem me ajudado a pensar sobre os pedidos de desculpa e os efeitos que eles têm nas nossas vidas e na nossa autoestima. Segue comigo para entender.
Eu tenho me sentido mais segura e assertiva, quando me expresso de uma maneira mais coerente com o que eu sinto e quando eu ajo com mais consciência. Tenho bancado os efeitos do que eu digo nas outras pessoas – como desagradar e frustrar expectativas alheias. Isso porque a comunicação e, especificamente aqui, os pedidos de desculpa, tem muito a ver com a autoconfiança e o auto-respeito, pilares que sustentam nossa autoestima. Sendo assim, os pedidos de desculpas podem dizer muito sobre como vemos a nós mesmos e como nos relacionamos com outras pessoas. A boa notícia é que “pedir desculpas” é uma habilidade que podemos aprender a desenvolver da maneira que faça mais sentido para nós e para nosso contexto. Nesse texto vamos mostrar 3 situações nas quais os pedidos de desculpa podem ser sinais de baixa autoestima e como podemos lidar melhor com essas situações.
*Ah, antes vale esclarecer que as questões culturais são complexas e rendem muitas discussões e pontos de vistas diversos. Utilizo algo minha experiência apenas para puxar uma reflexão, ok?
1. DESCULPA POR PEDIR DESCULPA: Por que você tem a necessidade de se desculpar toda a hora
Muitas vezes, sentir-nos deslocadas/os pode estar sendo o motivo pelo qual pedimos mais desculpas do que deveríamos. Quando conhecemos alguém novo ou somos apresentamos a um novo ambiente, como em um país novo e diferente, levamos um tempo para entender como tudo funciona. Ao mergulharmos nessa nova configuração podemos entrar em pânico, sentir-nos inadequadas/os e pedir desculpas sem nunca parar e pensar sobre isso.
No entanto, nem sempre devemos pedir desculpas, outras coisas podem ser ditas. Faz parte do choque cultural e do processo de adaptação viver momentos nos quais nos sentimos confusas/os, desorientadas/os e inadequadas/os. Sem dúvida que pedir desculpa pode ser um bom “quebra-gelo” e gerar conexão, mas tem um limite. Porque se desculpar o tempo todo faz perder o sentido e a relevância de um “pedido de desculpa”. Quando pedimos desculpa quando pedimos algo, por exemplo, podemos estar diminuindo o que é importante para nós. Sabe aquele: “desculpa incomodá-la, mas eu posso…”? Que tal experimentar trocar por “É possível você fazer ….? Obrigada pela sua atenção e disponibilidade, me ajudou muito”.
Além disso, quando pedimos desculpas sem nenhum filtro, podemos dar a impressão de estarmos propensos a cometer erros ou até de que somos incompetentes. Dependendo do contexto, isso vai agredindo a nossa autoestima e vai afetando a nossa própria percepção sobre as coisas e sobre a gente mesmo. Faz sentido para você?
2. DESCULPA COMO “UMA DESCULPA”
Você costuma pedir desculpa a todo o momento e por qualquer motivo? Você já parou para pensar se as suas desculpas são sinceras ou são hábitos educados que você aprendeu desde cedo no convívio social? Em algumas situações as desculpas podem estar servindo para evitar um conflito ou uma situação desconfortável. Ou ainda, para a agradar e manter uma imagem sua sempre “positiva”. Ao invés de dizer “não, obrigada”. Você inventa um motivo: “desculpa, tenho um jantar nesse dia”.
Euzinha, já fiz muito disso. Até perceber que, em realidade, eu não estava sendo honesta nem traçando meus limites e isso diminuía meu auto-respeito. Por um lado, podia estar me safando de enfrentar uma reação desagradável da outra pessoa, de decepcionar ou de fazê-la pensar coisas negativas ao meu respeito. Por outro lado, eu estava desvalorizando o meu desejo e a minha necessidade (por exemplo não ir jantar porque não estou no clima depois de um dia estressante no trabalho). Eu entendi que estava me diminuindo toda a vez que eu não era honesta, nem comigo e nem com o outra pessoa.
Quando usamos muito essas “desculpas” deixamos de levar em conta os nossos critérios. Perdemos o respeito pelos nossos valores, direitos e renunciamos a relacionamentos igualitários. O mais curioso é que quando mudamos a nossa postura, também passamos a aceitar melhor os “nãos” e limites das outras pessoas, sem precisar ouvir um pedido de desculpa.
Podemos mudar essas situações com um pouco de treino. Sim, é possível aprender a se expressar de uma maneira mais aberta, assertiva e gentil. No entanto, algumas vezes vai vai ser necessário entrar e resolver os conflitos ou invés de evitá-los.
3. AUTOCONFIANÇA E PELO QUE NÃO DEVEMOS NOS DESCULPAR
Antes de mais nada, você não deve se desculpar por dizer não. Porque dizer sempre “sim” para os outros é dizer “não” para nós mesmas/os. Do mesmo modo, você não deve se desculpar por amar alguém e por sentir o que você sente. Ainda que seja nossa responsabilidade o que fazemos com o que a gente sente. Também não devemos nos desculpar por ter limitações, mesmo que as pessoas esperem que você faça algo que não consiga, seja questão física, psicológica ou de qualquer outra natureza. Nem por dizer a verdade, por chorar ou por não saber uma resposta.
Assim como você não precisa se desculpar por ser quem é – claro que você deveria sim se desculpar por comportamentos que teve, mas isso é tema para outro texto, tá? 🙂 Sobretudo, não precisamos ficar pedindo desculpas pela condição na qual nos encontramos no momento, como por exemplo a de migrantes e expatriadas/os. Por trás desse desse pedido de desculpa pode ter um sentimento de vergonha, incapacidade ou inferioridade.. já carregamos muitas cargas e dessa, podemos nos liberar!
Por último, quero dizer que a vida vai te colocar em diversas situações em que você vai ter que fazer algum tipo de escolha. Algumas mais fáceis, outras mais complexas. Mas isso não significa você precise pedir desculpas por decidir entre uma coisa e outra. Antes de escolher você pode colocar na balança os ônus e bônus de cada opção e estar ciente das consequências. Assim você poderá lidar com as suas escolher e com os efeitos delas, sabendo que você fez o que achou ser o melhor!
Essa reflexão fez sentido pra você? Comenta com a gente as suas experiências, insights e tudo mais que quiser. Vamos amar ler e compartilhar por aí nesse mundão.
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Quem escreve:
Luiza Sbrissa é Psicoterapeuta especializanda em Terapia de Aceitação e Compromisso e Mindfulness, e se dedica a ajudar brasileiros/as e hispanohablantes que vivem no exterior a melhorar sua saúde mental e bem-estar. Com formação em Psicologia e Mestrado pela Universidade Federal de Santa Maria no Brasil, Luiza tem experiência em pesquisa na Espanha em temas como Psicologia Social, migrações e estudos feministas, o que traz uma perspectiva interdisciplinar e multicultural para o seu trabalho como Psicoterapeuta. Ela oferece suporte online a pessoas em todo o mundo, ajudando-os a desenvolver habilidades para lidar com emoções difíceis e construir uma vida mais plena e satisfatória. Seu objetivo é fornecer um espaço seguro e acolhedor para que a pessoa possa explorar seus pensamentos e sentimentos, descobrir seus valores e aprender a agir de acordo com eles.
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